Por Wilson Tavares Bastos, e Rosângela Tremel
Para que haja uma prestação jurisdicional célere e eficaz, o direito deve ser dinâmico. A meta de alcançar tal dinamismo não é diferente no âmbito da Justiça do Trabalho. Desde o advento da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como das legislações posteriores à CLT, é patente a busca incessante para conferir maior celeridade ao processo do trabalho, seja reduzindo a possibilidade da interposição de recursos, como é o caso nos dissídios de alçada, bem como nos embargos de terceiro, em que o Recurso de Revista, cuja matéria, para fins de seguimento, só poderá versar sobre violação literal a dispositivo constitucional, por força do artigo 896, alínea c, §2º ,da CLT.
A fim de limitar a interposição de recursos, o artigo 7º da Lei nº 5.584/70 impôs a necessidade de depósito recursal prévio, sob pena de deserção e, finalmente, o artigo 14 dessa Lei limitou a concessão da gratuidade de justiça apenas para o trabalhador assistido pelo sindicato, in verbis.
Art. 14. Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador.
§ 1º. A assistência é devida, a todo aquele que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
§ 2º. A situação econômica do trabalhador será comprovada em atestado fornecido pela autoridade local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, mediante diligência sumária, que não poderá exceder de 48 (quarenta e oito) horas.
§ 3º. Não havendo no local a autoridade referida no parágrafo anterior, o atestado deverá ser expedido pelo Delegado de Polícia da circunscrição onde resida o empregado.
Fundamentado neste artigo,os Tribunais Regionais do Trabalho, bem como o Tribunal Superior do Trabalho, vêm relutando em conceder a gratuidade de justiça às pessoas jurídicas, aduzindo que apenas os reclamantes trabalhadores estão autorizados a serem beneficiários pelo instituto da gratuidade no Judiciário , regido pela Lei nº 1.060/50.No entanto, essa não parece, nem pode ser, a melhor alternativa, num contexto em que o inciso IV do artigo 1º da Constituição Federal prega como princípio fundamental o da livre iniciativa, materializado no estímulo à criação de micro empresas. Todo o cenário econômico brasileiro destoa do indeferimento à gratuidade de justiça às pessoas jurídicas de plano, sem uma acurada análise caso a caso. Há que se considerar exceções dentro da sistemática jurídica vigente. É o que se pretende demonstrar ao longo desse artigo.
A Gratuidade de Justiça sob a ótica da Lei nº 5.584/70
Pela simples leitura do já citado artigo 14 da Lei nº. 5.584/70, juntamente com os seus parágrafos, chega-se à ilação de que a assistência judiciária não ficou restrita ao Reclamante - trabalhador, mas apenas dispõe que a assistência judiciária seria prestada pelo sindicato. Trata-se de um dispositivo legal específico, porém, não taxativo, ou numerus clausus, já que tal legislação apenas se preocupa em disciplinar a assistência dos sindicatos nos dissídios entre empregados e empregadores. Não há qualquer dispositivo expresso na Lei nº 5.584/70 contendo as expressões somente, tão só, apenas, ou seja, expressões que conferissem apenas aos trabalhadores o direito à assistência judiciária.
Ora, se prevalecer raciocínio diverso, chegar-se-ia ao absurdo de apenas conceder a gratuidade de justiça àqueles trabalhadores assistidos por sindicato.
Ademais, não podem ser confundidos os institutos da Assistência Judiciária com a Justiça Gratuita, pois, embora sejam institutos semelhantes. Basta observar a doutrina nas palavras de Bolívar Viégas Peixoto, para quem “É certo que a assistência judiciária é diferente da justiça gratuita. Mesmo que algumas vezes sejam confundidas, há distinção entre as duas figuras,porque a assistência judiciária pressupõe a participação do assistente – o sindicato – que exerce os direitos do trabalhador. Portanto, neste caso, há recebimento de honorários de advogado, pela sucumbência, para fazer frente às despesas que o órgão sindical deve ter para manter um corpo jurídico destinado a dar orientação ao associado e acompanhamento das suas reclamações”
Desta forma, o artigo 14 da Lei nº 5.584/70 nem sequer deveria ser citado como sucedâneo para o indeferimento da gratuidade de Justiça, seja para aqueles que não estão litigando sob a prestação do sindicato, seja para as pessoas jurídicas. No entanto, não é esse o entendimento dos Tribunais Regionais do Trabalho, mormente o da 3ª Região, para quem o direito à concessão à gratuidade de Justiça “só alcança a pessoa física, não restando preenchido o requisito elencado n parágrafo 3º. Do artigo 790 da CLT, no que se refere à associação embargante, e muito menos aquele estabelecido no artigo 14 da Lei nº 5.584/70” . Decisões semelhantes também já foram tomadas no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, pelos votos dos Ministros Rider Nogueira de Brito e Antônio José de Barros Levenhagem
Ainda que seja admitida a impossibilidade de concessão de gratuidade de justiça, por causa do dispositivo legal em comento, tal impedimento certamente não resistirá ao cotejo com preceitos de ordem constitucional, como o artigo 5º, LXXIV da Constituição da República,que por estar inserido no capítulo de garantias e direitos fundamentais, não necessita de lei regulamentadora,vale dizer que é norma auto - aplicável.
:“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...Omissis)
LXXIV – O Estado prestará assistência jurídica gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” (sem grifo no original)
O que se depreende de uma simples análise do exposto, é que a lei maior não faz distinção entre as pessoas físicas e jurídicas, apenas mencionando o único requisito para a concessão da assistência judiciária, qual seja a insuficiência de recursos.
Assim sendo e, tendo em vista o caráter de norma auto aplicável da norma constitucional em comento, não cabe à legislação infraconstitucional (ou seja, o artigo 790 – B da CLT) distinguir onde a Lei maior Republicana não faz essa distinção. Logo, o art. 14, parágrafo 1º, da Lei nº 5.584/70 não foi recepcionado pela Constituição da República, e o artigo 790 – A do texto consolidado, se igualmente interpretado de forma restritiva, se torna inconstitucional, uma vez que a distinção entre pessoa física e jurídica é vedada pelo artigo 5º, LXXIV da Lei Maior, além, é claro, de lei ordinária não poder restringir o alcance da norma constitucional.
É certo que o depósito recursal foi criado com o fito de compelir as grandes empresas a desembolsarem vultosas quantias e, assim, ver as suas razões de inconformismo reapreciadas pelo Tribunal. Porém, as condições de uma grande parcela das empresas não são as mesmas da época da edição da Lei 5.584/70. Hoje as micro e pequenas empresas tomam cada vez mais conta do mercado, também não podem ser esquecidas as fundações e associações que, sem finalidade lucrativa não possuem condições de arcar com o pagamento de elevados valores para recorrer.
A insuficiência de recursos personifica-se no alto valor das despesas processuais com recursos na esfera da Justiça do Trabalho e, por outro lado, na condição precária das micro e pequenas empresas bem como às fundações e associações sem fins lucrativos. Ora, não é razoável crer que uma pessoa jurídica com o capital social de R$2.000,00 possa arcar com o pagamento de cerca de R$5.000,00 ou quase R$10.000,00 em caso de interposição de Recurso de Revista, se prejuízo de sua existência.
Nesse sentido, e no âmbito da Justiça Comum, já se manifestou de forma reiterada o Superior Tribunal de Justiça, sobre a interpretação da Lei nº1.060/50 em conformidade com o artigo 5º, LVXXIV da lei Maior , conforme ressaltado no contexto deste artigo. Parece restar incontroverso, portanto, que, demonstrada a insuficiência de recursos, a pessoa jurídica fará jus aos benefícios da assistência, nos termos do inciso do artigo 5º da Constituição Federal que prega o princípio da igualdade.
A Gratuidade de Justiça e o artigo 5º, LVXXIV da Constituição da República
O caminho se faz ao andar . Este mote pode ser o sustentáculo da necessidade de repensar a questão da gratuidade ora proposta, bem como albergar a esperança de que a sociedade civil organizada em forma de ongs com o objetivo de suprir omissões do Estado e os micro empresários, cuja atitude empreendedora se materializa em dados como a área de maior geração de empregos no contexto nacional, sejam brindados, em futuro próximo, com jurisprudência específica versando sobre o mencionado art 14 da Lei nº 5.584/70. No momento, o que mais se assemelha em termos jurisprudenciais está exemplificado nestes dois exemplos retirados da coletânea do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO CONFIGURADA – CONCESSÃO DE EFEITOS MODIFICATIVOS – POSSIBILIDADE – JUSTIÇA GRATUITA – PESSOA JURÍDICA – POSSIBILIDADE – ENTIDADE FILANTRÓPICA – REQUISITOS PRESENTES – PEDIDO DEFERIDO – EMBARGOS ACOLHIDOS – I – Configurada a apontada omissão, acolhem-se os embargos. II – Se a correção do vício acarreta a alteração do resultado do julgamento, é possível a concessão de efeitos infringentes aos embargos de declaração. III – Na linha da jurisprudência deste Tribunal, é "possível a concessão do benefício da assistência judiciária à pessoa jurídica que demonstre a impossibilidade de arcar com as despesas do processo sem prejudicar a própria manutenção". IV – No caso, a própria natureza filantróprica da recorrente já evidencia o prejuízo que, certamente, advirá para a manutenção da atividade assistencial prestada à significativa parcela da sociedade, caso tenha que arcar com os ônus decorrentes do processo. (STJ – EDRESP 205835 – SP – 4ª T. – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – DJU 23.06.2003 – p. 00372) (sem grifo no original)
JUSTIÇA GRATUITA - PESSOA JURÍDICA - O prejuízo do sustento próprio, a que se refere o parágrafo único do art. 2º da Lei n.º 1060/50, pode dizer também com a pessoa jurídica (REsp. 122.129-RJ). Recurso conhecido e provido."( STJ - REsp. 135181 - RJ - 3ª T. - Rel. Min. Costa Leite - DJU29.03.1999 - p. 162.)
Considerações Finais.
Resta demonstrado, calcado em análise de decisões do Superior Tribunal de Justiça e com robusto amparo legal que o aludido artigo 14, bem como o artigo 790 – A da CLT ,não constituem óbices para a concessão da Gratuidade de Justiça, principalmente, diante da inexistência expressa de qualquer dispositivo que enseje a limitação da justiça gratuita às pessoas físicas. As empresas que não possuem condições de pagar as custas processuais trabalhistas, principalmente o recolhimento do depósito recursal prévio, também estão impossibilitadas de receber os benefícios da Justiça Gratuita, uma vez que, sob o entendimento jurisprudencial dominante na Justiça do Trabalho, apenas as pessoas físicas, os empregados reclamantes fazem jus à gratuidade de justiça, por força do artigo 14 da lei 5.584/70.
Um exercício básico de interpretação teleológica, calcado no artigo 5º, LXXIV da Constituição Federal , afasta qualquer distinção entre as pessoas físicas e jurídicas no que concerne à concessão da gratuidade de justiça, por se tratar de dispositivo constitucional de norma de eficácia plena.A justiça gratuita deverá ser concedida tão logo preencha o requisito de insuficiência de recursos, postura que vêm sendo tomada pelo Superior Tribunal de Justiça que tem o condão de visualizar que, na busca de um provimento jurisdicional rápido, o Legislador limita a quantidade dos meios processuais, reduz mais as possibilidades de recorrer, seja limitando as matérias a serem aduzidas em grau de recurso, seja impondo à parte sucumbente (no caso, os empregadores, já que os empregados são, geralmente, beneficiados com a gratuidade de justiça) o condicionamento da interposição do recurso ao depósito prévio de uma quantia que geralmente é vultosa e além das possibilidades financeiras de uma grande parcela das pessoas jurídicas, considerando-se neste contexto as micro empresas.
Logo, diante da flagrante violação de dispositivo constitucional, os Tribunais Regionais do Trabalho, bem como o Superior Tribunal do Trabalho, deverão rever as suas posições quanto à interpretação e aplicabilidade dos artigos 14 da Lei nº 5.584/70 e 790 – A da Consolidação das Leis do Trabalho, adequando-as conforme à Constituição, o que já vem ocorrendo no âmbito da Justiça comum no que tange à Lei nº 1.060/50. Assim, diante da mudança de posicionamento, deverá ser concedida a Gratuidade de Justiça às pessoas jurídicas que efetivamente demonstrarem insuficiência de recursos.
Para que haja uma prestação jurisdicional célere e eficaz, o direito deve ser dinâmico. A meta de alcançar tal dinamismo não é diferente no âmbito da Justiça do Trabalho. Desde o advento da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como das legislações posteriores à CLT, é patente a busca incessante para conferir maior celeridade ao processo do trabalho, seja reduzindo a possibilidade da interposição de recursos, como é o caso nos dissídios de alçada, bem como nos embargos de terceiro, em que o Recurso de Revista, cuja matéria, para fins de seguimento, só poderá versar sobre violação literal a dispositivo constitucional, por força do artigo 896, alínea c, §2º ,da CLT.
A fim de limitar a interposição de recursos, o artigo 7º da Lei nº 5.584/70 impôs a necessidade de depósito recursal prévio, sob pena de deserção e, finalmente, o artigo 14 dessa Lei limitou a concessão da gratuidade de justiça apenas para o trabalhador assistido pelo sindicato, in verbis.
Art. 14. Na Justiça do Trabalho, a assistência judiciária a que se refere a Lei nº 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo Sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador.
§ 1º. A assistência é devida, a todo aquele que perceber salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ficando assegurado igual benefício ao trabalhador de maior salário, uma vez provado que sua situação econômica não lhe permite demandar, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.
§ 2º. A situação econômica do trabalhador será comprovada em atestado fornecido pela autoridade local do Ministério do Trabalho e Previdência Social, mediante diligência sumária, que não poderá exceder de 48 (quarenta e oito) horas.
§ 3º. Não havendo no local a autoridade referida no parágrafo anterior, o atestado deverá ser expedido pelo Delegado de Polícia da circunscrição onde resida o empregado.
Fundamentado neste artigo,os Tribunais Regionais do Trabalho, bem como o Tribunal Superior do Trabalho, vêm relutando em conceder a gratuidade de justiça às pessoas jurídicas, aduzindo que apenas os reclamantes trabalhadores estão autorizados a serem beneficiários pelo instituto da gratuidade no Judiciário , regido pela Lei nº 1.060/50.No entanto, essa não parece, nem pode ser, a melhor alternativa, num contexto em que o inciso IV do artigo 1º da Constituição Federal prega como princípio fundamental o da livre iniciativa, materializado no estímulo à criação de micro empresas. Todo o cenário econômico brasileiro destoa do indeferimento à gratuidade de justiça às pessoas jurídicas de plano, sem uma acurada análise caso a caso. Há que se considerar exceções dentro da sistemática jurídica vigente. É o que se pretende demonstrar ao longo desse artigo.
A Gratuidade de Justiça sob a ótica da Lei nº 5.584/70
Pela simples leitura do já citado artigo 14 da Lei nº. 5.584/70, juntamente com os seus parágrafos, chega-se à ilação de que a assistência judiciária não ficou restrita ao Reclamante - trabalhador, mas apenas dispõe que a assistência judiciária seria prestada pelo sindicato. Trata-se de um dispositivo legal específico, porém, não taxativo, ou numerus clausus, já que tal legislação apenas se preocupa em disciplinar a assistência dos sindicatos nos dissídios entre empregados e empregadores. Não há qualquer dispositivo expresso na Lei nº 5.584/70 contendo as expressões somente, tão só, apenas, ou seja, expressões que conferissem apenas aos trabalhadores o direito à assistência judiciária.
Ora, se prevalecer raciocínio diverso, chegar-se-ia ao absurdo de apenas conceder a gratuidade de justiça àqueles trabalhadores assistidos por sindicato.
Ademais, não podem ser confundidos os institutos da Assistência Judiciária com a Justiça Gratuita, pois, embora sejam institutos semelhantes. Basta observar a doutrina nas palavras de Bolívar Viégas Peixoto, para quem “É certo que a assistência judiciária é diferente da justiça gratuita. Mesmo que algumas vezes sejam confundidas, há distinção entre as duas figuras,porque a assistência judiciária pressupõe a participação do assistente – o sindicato – que exerce os direitos do trabalhador. Portanto, neste caso, há recebimento de honorários de advogado, pela sucumbência, para fazer frente às despesas que o órgão sindical deve ter para manter um corpo jurídico destinado a dar orientação ao associado e acompanhamento das suas reclamações”
Desta forma, o artigo 14 da Lei nº 5.584/70 nem sequer deveria ser citado como sucedâneo para o indeferimento da gratuidade de Justiça, seja para aqueles que não estão litigando sob a prestação do sindicato, seja para as pessoas jurídicas. No entanto, não é esse o entendimento dos Tribunais Regionais do Trabalho, mormente o da 3ª Região, para quem o direito à concessão à gratuidade de Justiça “só alcança a pessoa física, não restando preenchido o requisito elencado n parágrafo 3º. Do artigo 790 da CLT, no que se refere à associação embargante, e muito menos aquele estabelecido no artigo 14 da Lei nº 5.584/70” . Decisões semelhantes também já foram tomadas no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, pelos votos dos Ministros Rider Nogueira de Brito e Antônio José de Barros Levenhagem
Ainda que seja admitida a impossibilidade de concessão de gratuidade de justiça, por causa do dispositivo legal em comento, tal impedimento certamente não resistirá ao cotejo com preceitos de ordem constitucional, como o artigo 5º, LXXIV da Constituição da República,que por estar inserido no capítulo de garantias e direitos fundamentais, não necessita de lei regulamentadora,vale dizer que é norma auto - aplicável.
:“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...Omissis)
LXXIV – O Estado prestará assistência jurídica gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos” (sem grifo no original)
O que se depreende de uma simples análise do exposto, é que a lei maior não faz distinção entre as pessoas físicas e jurídicas, apenas mencionando o único requisito para a concessão da assistência judiciária, qual seja a insuficiência de recursos.
Assim sendo e, tendo em vista o caráter de norma auto aplicável da norma constitucional em comento, não cabe à legislação infraconstitucional (ou seja, o artigo 790 – B da CLT) distinguir onde a Lei maior Republicana não faz essa distinção. Logo, o art. 14, parágrafo 1º, da Lei nº 5.584/70 não foi recepcionado pela Constituição da República, e o artigo 790 – A do texto consolidado, se igualmente interpretado de forma restritiva, se torna inconstitucional, uma vez que a distinção entre pessoa física e jurídica é vedada pelo artigo 5º, LXXIV da Lei Maior, além, é claro, de lei ordinária não poder restringir o alcance da norma constitucional.
É certo que o depósito recursal foi criado com o fito de compelir as grandes empresas a desembolsarem vultosas quantias e, assim, ver as suas razões de inconformismo reapreciadas pelo Tribunal. Porém, as condições de uma grande parcela das empresas não são as mesmas da época da edição da Lei 5.584/70. Hoje as micro e pequenas empresas tomam cada vez mais conta do mercado, também não podem ser esquecidas as fundações e associações que, sem finalidade lucrativa não possuem condições de arcar com o pagamento de elevados valores para recorrer.
A insuficiência de recursos personifica-se no alto valor das despesas processuais com recursos na esfera da Justiça do Trabalho e, por outro lado, na condição precária das micro e pequenas empresas bem como às fundações e associações sem fins lucrativos. Ora, não é razoável crer que uma pessoa jurídica com o capital social de R$2.000,00 possa arcar com o pagamento de cerca de R$5.000,00 ou quase R$10.000,00 em caso de interposição de Recurso de Revista, se prejuízo de sua existência.
Nesse sentido, e no âmbito da Justiça Comum, já se manifestou de forma reiterada o Superior Tribunal de Justiça, sobre a interpretação da Lei nº1.060/50 em conformidade com o artigo 5º, LVXXIV da lei Maior , conforme ressaltado no contexto deste artigo. Parece restar incontroverso, portanto, que, demonstrada a insuficiência de recursos, a pessoa jurídica fará jus aos benefícios da assistência, nos termos do inciso do artigo 5º da Constituição Federal que prega o princípio da igualdade.
A Gratuidade de Justiça e o artigo 5º, LVXXIV da Constituição da República
O caminho se faz ao andar . Este mote pode ser o sustentáculo da necessidade de repensar a questão da gratuidade ora proposta, bem como albergar a esperança de que a sociedade civil organizada em forma de ongs com o objetivo de suprir omissões do Estado e os micro empresários, cuja atitude empreendedora se materializa em dados como a área de maior geração de empregos no contexto nacional, sejam brindados, em futuro próximo, com jurisprudência específica versando sobre o mencionado art 14 da Lei nº 5.584/70. No momento, o que mais se assemelha em termos jurisprudenciais está exemplificado nestes dois exemplos retirados da coletânea do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSO CIVIL – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO CONFIGURADA – CONCESSÃO DE EFEITOS MODIFICATIVOS – POSSIBILIDADE – JUSTIÇA GRATUITA – PESSOA JURÍDICA – POSSIBILIDADE – ENTIDADE FILANTRÓPICA – REQUISITOS PRESENTES – PEDIDO DEFERIDO – EMBARGOS ACOLHIDOS – I – Configurada a apontada omissão, acolhem-se os embargos. II – Se a correção do vício acarreta a alteração do resultado do julgamento, é possível a concessão de efeitos infringentes aos embargos de declaração. III – Na linha da jurisprudência deste Tribunal, é "possível a concessão do benefício da assistência judiciária à pessoa jurídica que demonstre a impossibilidade de arcar com as despesas do processo sem prejudicar a própria manutenção". IV – No caso, a própria natureza filantróprica da recorrente já evidencia o prejuízo que, certamente, advirá para a manutenção da atividade assistencial prestada à significativa parcela da sociedade, caso tenha que arcar com os ônus decorrentes do processo. (STJ – EDRESP 205835 – SP – 4ª T. – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – DJU 23.06.2003 – p. 00372) (sem grifo no original)
JUSTIÇA GRATUITA - PESSOA JURÍDICA - O prejuízo do sustento próprio, a que se refere o parágrafo único do art. 2º da Lei n.º 1060/50, pode dizer também com a pessoa jurídica (REsp. 122.129-RJ). Recurso conhecido e provido."( STJ - REsp. 135181 - RJ - 3ª T. - Rel. Min. Costa Leite - DJU29.03.1999 - p. 162.)
Considerações Finais.
Resta demonstrado, calcado em análise de decisões do Superior Tribunal de Justiça e com robusto amparo legal que o aludido artigo 14, bem como o artigo 790 – A da CLT ,não constituem óbices para a concessão da Gratuidade de Justiça, principalmente, diante da inexistência expressa de qualquer dispositivo que enseje a limitação da justiça gratuita às pessoas físicas. As empresas que não possuem condições de pagar as custas processuais trabalhistas, principalmente o recolhimento do depósito recursal prévio, também estão impossibilitadas de receber os benefícios da Justiça Gratuita, uma vez que, sob o entendimento jurisprudencial dominante na Justiça do Trabalho, apenas as pessoas físicas, os empregados reclamantes fazem jus à gratuidade de justiça, por força do artigo 14 da lei 5.584/70.
Um exercício básico de interpretação teleológica, calcado no artigo 5º, LXXIV da Constituição Federal , afasta qualquer distinção entre as pessoas físicas e jurídicas no que concerne à concessão da gratuidade de justiça, por se tratar de dispositivo constitucional de norma de eficácia plena.A justiça gratuita deverá ser concedida tão logo preencha o requisito de insuficiência de recursos, postura que vêm sendo tomada pelo Superior Tribunal de Justiça que tem o condão de visualizar que, na busca de um provimento jurisdicional rápido, o Legislador limita a quantidade dos meios processuais, reduz mais as possibilidades de recorrer, seja limitando as matérias a serem aduzidas em grau de recurso, seja impondo à parte sucumbente (no caso, os empregadores, já que os empregados são, geralmente, beneficiados com a gratuidade de justiça) o condicionamento da interposição do recurso ao depósito prévio de uma quantia que geralmente é vultosa e além das possibilidades financeiras de uma grande parcela das pessoas jurídicas, considerando-se neste contexto as micro empresas.
Logo, diante da flagrante violação de dispositivo constitucional, os Tribunais Regionais do Trabalho, bem como o Superior Tribunal do Trabalho, deverão rever as suas posições quanto à interpretação e aplicabilidade dos artigos 14 da Lei nº 5.584/70 e 790 – A da Consolidação das Leis do Trabalho, adequando-as conforme à Constituição, o que já vem ocorrendo no âmbito da Justiça comum no que tange à Lei nº 1.060/50. Assim, diante da mudança de posicionamento, deverá ser concedida a Gratuidade de Justiça às pessoas jurídicas que efetivamente demonstrarem insuficiência de recursos.
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