AP 470: Relator explicita em seu voto mecanismos da lavagem de dinheiro
A sessão desta segunda-feira do Supremo Tribunal Federal (STF) foi iniciada com a leitura do voto do relator da Ação Penal (AP) 470, ministro Joaquim Barbosa, sobre a acusação de lavagem de dinheiro contra os réus ligados às agências de publicidade (DNA, SMP&B) e ao Banco Rural, constante do item IV da denúncia. Com base em laudos periciais realizados pelo Instituto Nacional de Criminalística (INC), o relator apontou a ocorrência de fraudes contábeis nas agências de publicidade e também na empresa de advocacia do réu Rogério Tolentino, cuja conduta foi analisada na sessão de hoje.
Quanto ao Banco Rural, o ministro Joaquim Barbosa enfatizou as condutas que foram objeto da análise do crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, cujos laudos também dão suporte à acusação de lavagem de dinheiro. “Anoto desde logo que o acervo probatório, tanto os testemunhos e interrogatórios colhidos quanto os documentos juntados e em especial o conjunto de perícias realizadas, confirmam a tese da acusação”, afirmou o relator ao iniciar seu voto.
Fraudes contábeis
Segundo o relator, o conjunto de perícias realizadas nos documentos apreendidos nas sedes das agências de Marcos Valério e seus sócios indica a prática de inúmeras fraudes contábeis, como a emissão de milhares de notas fiscais frias (80 mil na SMP&B Comunicação e 55 mil na DNA Propaganda), lançamentos para permitir a simulação de empréstimos bancários e falsificação, alteração de registros e documentos, entre outras. Peritos encontraram nota fiscal de R$ 35 milhões em nome da Visanet, que foi lançada como receita de prestação de serviços no mesmo ano em que a DNA declarou ter obtido receita bruta de R$ 22,6 milhões. Fatos similares foram verificados com outras notas fiscais.
“As fraudes contábeis e os empréstimos simulados constituíram importantes etapas para o repasse dissimulado de expressivos recursos a destinatários que, apesar de conhecidos, eram dolosamente ocultados das entidades e órgãos de controle, notadamente o Banco Central e o Coaf”, disse o relator. Ainda segundo o ministro Joaquim Barbosa, por sua vez, os dirigentes do Banco Rural atuaram de forma orquestrada e “foram vitais” para o sucesso das operações. “Com inestimável concurso dos principais dirigentes do Banco Rural à época, tornou-se possível a dissimulação da transferência desses valores”, ressaltou.
O ministro afirmou que tanto na DNA quanto na SMP&B, os peritos encontraram uma contabilidade original e outra contabilidade retificadora, com valores bastante discrepantes. Em 31/12/2003, a contabilidade original da DNA apontava ativo total de R$ 5,8 milhões, enquanto na retificadora esse valor era de R$ 53,2 milhões na mesma data. Salientou que a retificação foi feita em total desacordo com as normas de contabilidade vigentes e após a divulgação do escândalo. Em 31/12/2004, também na DNA, o fato se repetiu: R$ 28,7 milhões (contabilidade original) e R$ 72,3 milhões (retificadora). O ministro-relator chamou atenção para a coincidência dos valores desviados do Fundo Visanet, já analisados no item III da denúncia.
Banco Rural
De acordo com o relator, a simulação dos empréstimos bancários constituiu outra etapa da lavagem. Laudos, segundo ele, apontam que o Banco Rural, à época dos exames periciais feitos em Belo Horizonte (MG), não apresentou informações requeridas pelo STF porque tentava dissimular a real situação de sua contabilidade, pois não tinha os livros diários de 2004 devidamente registrados, sendo que só foram providenciados em 2006, já no bojo das investigações. Segundo o relator, a conduta permitiu “a ocultação dos reais recebedores das quantias, que eram indicados pelos integrantes do núcleo publicitário (notadamente Marcos Valério auxiliado por Simone Vasconcelos e Geiza Dias) que, por sua vez, eram orientados pelos membros do núcleo político, que tinha Delúbio Soares como principal interlocutor ou elo com o núcleo publicitário ou operacional”.
“Em suma, todas essas fraudes contábeis constituíram importante etapa para que os membros do chamado ‘núcleo publicitário’ conseguissem repassar, através do Banco Rural, valores milionários com a dissimulação da natureza, origem, localização e movimentação dessas quantias, bem como com a ocultação da propriedade dos valores e dos verdadeiros beneficiários desses recursos, sabidamente provenientes de crime contra a Administração Pública e o Sistema Financeiro Nacional, além de praticados por organização criminosa, o que configura os elementos do tipo descrito no artigo 1º da Lei 9.613/1998”, afirmou o ministro Joaquim Barbosa.
Rogério Tolentino
Ao tratar da conduta do réu Rogério Tolentino, advogado da SMP&B e sócio da Rogério Lanza Tolentino & Associados, acusado, entre outros crimes, de lavagem de dinheiro em razão de empréstimo feito no Banco BMG, no valor de R$ 10 milhões, o relator destacou que, de acordo com as provas dos autos, esse empréstimo foi simulado e serviu para lavar R$ 10 milhões desviados do Banco do Brasil, tendo Tolentino recebido R$ 410 mil de remuneração por intermediar a “atípica e desnecessária operação de triangulação para mascarar a origem do dinheiro”. Tolentino disse em depoimento que tomou o empréstimo a pedido de Marcos Valério, assinou três cheques em branco a pedido dele e entregou-os a Simone Vasconcelos, não tendo ideia de como os recursos seriam utilizados. Segundo o ministro Joaquim Barbosa, laudos apontam que dois cheques foram depositados em benefício da Corretora Bônus Banval, que teria sido utilizada por parlamentares do Partido Progressista (PP) para receber dinheiro do esquema.
“Por todas essas razões, não há como negar que os réus dolosamente, em divisão de tarefas própria dos membros de um grupo criminoso organizado, além de fraudarem a contabilidade das pessoas jurídicas ligadas a Marcos Valério, assim como a do próprio Banco Rural, também atuaram intensamente na simulação de empréstimos bancários em mais uma importante etapa de dissimulação da natureza, da origem, da localização e movimentação de valores, com ocultação dos proprietários e beneficiários dessas quantias, sabidamente oriundas de crimes contra a Administração Pública e o Sistema Financeiro Nacional, bem como praticados por organização criminosa”, destacou o relator.
Repasse
Ao iniciar a análise sobre o repasse de dinheiro por meio do Banco Rural, o ministro-relator Joaquim Barbosa apontou que a principal etapa de lavagem de dinheiro contida na denúncia foi a ocultação dos verdadeiros proprietários e beneficiários dos valores repassados em espécie por meio da instituição financeira. “O Banco Rural tinha conhecimento dos reais destinatários, que eram informados por Marcos Valério, normalmente por meio de Geiza Dias (funcionária da agência de publicidade SMP&B), depois de indicados por Delúbio Soares (ex-tesoureiro do PT)”, disse o relator. Com isso, os reais sacadores do dinheiro não eram informados ao Banco Central e ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda.
De acordo com o ministro Joaquim Barbosa, foi observado que débitos na conta da SMP&B eram efetuados por meio de cheques nominais à própria empresa a título de pagar fornecedores. “Ao sacar cheque para disponibilizar recursos em espécie em agências fora de Belo Horizonte, a SMP&B apresentava documento timbrado do Banco Rural, denominado controle de transação em espécie, previamente preenchido, informando quem era o titular da conta sacada, que se destinava a pagamento de fornecedores, mas não discriminava os fornecedores”, explicou.
O relator afirmou que, embora o documento em questão seja importante no contexto das normas sobre lavagem de dinheiro, o Banco Rural acatava antecipadamente o instrumento de pagamento, solicitando, normalmente por e-mail, que o valor do cheque fosse pago a determinada pessoa, “o real beneficiário dos recursos, ainda que recebesse o documento de controle em transação de espécie com informações conflitantes em data posterior”.
Segundo o ministro Joaquim Barbosa, essa forma de transferência de recursos teve como consequência a ocultação dos reais beneficiários dos recursos. “O encobrimento dos inúmeros beneficiados só foi possível com o auxílio do Banco Rural, que, mesmo tendo ciência dos efetivos beneficiários, disponibilizou a estrutura para que Marcos Valério pudesse efetuar os saques em espécie a terceiros como se fossem pagamentos a fornecedores”, citou.
O relator assinalou que há e-mails enviados por Geiza Dias ao Banco Rural informando quem era a pessoa que receberia o dinheiro. “Fazer parecer que os valores em espécie repassados pelo Banco Rural se destinavam à SPM&B, quando na verdade era entregue a terceiros, caracteriza dissimulação, que é elemento do tipo descrito no artigo 1º da Lei 9.613/98 (que trata da lavagem de dinheiro). Levando em conta apenas o que foi descrito na denúncia, foram comprovadas 46 operações de lavagem de dinheiro realizadas através desse mecanismo”, observou.
O ministro Joaquim Barbosa sustentou que havia uma divisão de tarefas, “comum em grupos criminosos”, ficando cada agente incumbido de determinada função, de cujo desempenho dependia o sucesso da organização.
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