Convenções contra bitributação prevalecem sobre
legislação de Imposto de Renda
A fazenda nacional não pode exigir retenção de Imposto
de Renda na fonte em caso de serviços prestados a cliente nacional por empresa
estrangeira não estabelecida no Brasil. Para a Segunda Turma do Superior
Tribunal de Justiça (STJ), os acordos internacionais contra bitributação são
especiais em relação à lei que trata do Imposto de Renda.
O caso diz
respeito a convenções firmadas pelo Brasil com Alemanha e Canadá. A decisão
contraria a pretensão da fazenda de cobrar, na fonte, a título de imposto sobre
rendimento, 25% do pagamento feito pela empresa nacional à estrangeira. Os
serviços dizem respeito a contratos de prestação de assistência técnica e de
serviços técnicos sem transferência de tecnologia.
Segundo a fazenda, o
montante não poderia ser classificado como lucro da empresa estrangeira, já que
esse lucro só seria conhecido ao final do exercício. O pagamento não
constituiria lucro, mas apenas envio de receita. A convenção excluiria apenas a
incidência da tributação sobre lucros. Além disso, a lei nacional deveria se
sobrepor às convenções, anteriores à Constituição.
Lucro
operacional
O ministro Castro Meira, porém, apontou que o
conceito de lucro apresentado pela fazenda nacional não corresponde ao previsto
nas convenções. Conforme o relator, o termo “lucro da empresa estrangeira”
contido nas duas convenções não se refere ao "lucro real", mas ao “lucro
operacional”.
“A tese é engenhosa, mas não convence”, afirmou o
ministro. “É regra de hermenêutica que devem ser rechaçadas as interpretações
que levem ao absurdo, como é o caso da interpretação aqui defendida pela fazenda
nacional”, completou.
“Do contrário, não haveria materialidade possível
sobre a qual incidir o dispositivo, porque todo e qualquer pagamento ou
remuneração remetido ao estrangeiro está – e estará sempre – sujeito a adições e
subtrações ao longo do exercício financeiro”, esclareceu.
“A tributação
do rendimento somente no estado de destino permite que lá sejam realizados os
ajustes necessários à apuração do lucro efetivamente tributável. Caso se admita
a retenção antecipada – e portanto, definitiva – do tributo na fonte pagadora,
como pretende a fazenda nacional, serão inviáveis os referidos ajustes,
afastando-se a possibilidade de compensação se apurado lucro real negativo no
final do exercício financeiro”, afirmou Castro Meira.
Revogação
funcional
Quanto ao alegado conflito entre a lei tributária
interna e as convenções internacionais, o ministro apontou que ele deve ser
resolvido segundo o critério de especialidade da norma. Não se trataria,
portanto, de revogação própria da lei pela convenção.
“A norma interna
perde a sua aplicabilidade naquele caso específico, mas não perde a sua
existência ou validade em relação ao sistema normativo interno. Ocorre uma
revogação funcional”, afirmou o relator.
“A prevalência dos tratados
internacionais tributários decorre não do fato de serem normas internacionais, e
muito menos de qualquer relação hierárquica, mas de serem especiais em relação
às normas internas”, completou.
Globalização
O
ministro apontou ainda que a bitributação vincula-se à soberania nacional e pode
ser exercida pelos estados nacionais. Porém, constitui “patologia tributária”,
combatida por meio de acordos bi ou multilaterais, por meio dos quais as partes
transacionam a não incidência de certos tributos em certas condições.
“Ocorre que, na prática, quando os rendimentos são disponibilizados e
devem ser submetidos à tributação, o fisco quase sempre adota uma interpretação
literal e restritiva das normas convencionais, o que culmina com a não aplicação
do acordo. É justamente o caso dos autos”, asseverou.
stj.jus.br
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